sábado, 4 de março de 2017

"Porque os pobres, sempre os tendes convosco, mas a mim nem sempre me tendes". Mateus 26.11

Há alguns dias atrás esse texto chamou muito a minha atenção: ..."mas a mim nem sempre me tendes"... Claro que Jesus referia-se ao fato de que após ressuscitar e subir ao céu, não teríamos mais a sua presença física entre nós. Mas creio que há mais coisas que devemos aprender sobre sua presença a partir dessa sua declaração.

Contrapondo essa afirmação de Jesus com uma outra que Ele fez mais adiante, em Mateus 28.20, afirmando que estaria conosco "todos os dias até à consumação do século", verificamos que há diferentes dimensões da presença de Jesus em nossa vida, que vai desde a dimensão física e manifesta até a uma dimensão mística e imperceptível, baseada no seu atributo divino da onipresença. E creio que entender como se dá essa relação entre nossa experiência com Ele, nessas diferentes dimensões da sua presença, desempenha um papel chave em nosso crescimento em Deus. E eu quero fazer aplicação prática desse entendimento em nosso relacionamento com o Senhor.

Creio que podemos classificar a presença de Jesus (ou de Deus) em nossa vida, pelo menos, nos seguintes níveis:

- Presença manifesta (Epifania, perceptível aos 5 sentidos);
- Presença sensível consciente (que se pode sentir);
- Intervenção perceptível inconsciente (que se pode constatar a posteriori ou por evidências);
- Onipresença (imperceptível aos sentidos mas constante e em todo lugar).

A "epifania" é um termo teológico oriundo da palavra grega "epiphanéia" que significa "aparição" ou "manifestação visível" de algo invisível ou espiritual. É aplicada às raras situações onde Deus se manifestou visivelmente aos olhos humanos, como quando apareceu a Moisés na sarça ardente, no Sinai e na fenda da penha, onde o viu de relance pelas costas (Êxodo 33.1721-23). Na filosofia o termo "epifania" é usado também para descrever os momentos em que se obtém uma compreensão repentina de uma verdade profunda ou que se buscou por anos, um insight ou entendimento profundo de uma verdade transcendental. Mas não é nesse sentido filosófico que estou aplicando a palavra, mas no teológico.

Foram raros os momentos de epifania registrados nas escrituras e na história, mas a vida de Jesus pode ser definida, em um certo sentido, como a mais marcante e prolongada epifania da história, pois Ele era a revelação perfeita do Pai, a encarnação e presença visível de Deus entre os homens. Imagine: quem estava pessoalmente com Jesus, em um recinto ou em um campo ao ar livre, estava diante da própria presença manifesta de Deus entre os homens! Palpável e em carne e osso. Era algo extraordinário e é essa presença que Jesus disse, no texto inicial desse estudo, que nem sempre teríamos entre nós. 

Mas o Senhor Jesus disse que estaria conosco todos os dias até a consumação do século. Que Ele se manifestaria a todo que o ama e guarda os seus mandamentos (João 14.21). Fala da presença sensível consciente, quando o experimentamos e somos transformados pelo seu amor. E é essa experiência que entendo ser fundamental para o nosso crescimento em Deus, e que desejo fazer aplicação prática sobre como ela se dá e o que produz em nossa vida.

Você está Experimentando a Presença Real de Jesus?


Em Apocalipse 2.1-7 temos um texto muito conhecido e, ao mesmo tempo e a meu ver, surpreendente. Pois a mensagem de Jesus à igreja em Éfeso elenca uma série de qualidades que eles tinham e aponta também uma falha fundamental que apresentavam: faziam muitas coisas importantes e louváveis mas, ao mesmo tempo, haviam perdido o "primeiro amor". Eles tinham perseverança, não suportavam os homens maus, punham à prova e reprovavam os falsos apóstolos, suportavam provas por amor a Jesus (e tudo isso fazia deles melhores cristãos do que a maioria de nós hoje) mas estavam falhando nesse ponto essencial: haviam perdido contato com o real e verdadeiro amor de Jesus e por Jesus - o primeiro amor. 

Eu entendo que isso fala de ter perdido um relacionamento íntimo, de amor e correspondência com Jesus, onde a sua presença é real e transformadora. Essa presença é fundamental e deve ser uma realidade constante em nossa vida. Você está imerso e experimentando, constantemente, essa presença real e perceptível de Jesus? É uma força interior que te direciona e influencia todas as áreas da sua vida, de maneira real e marcante? E não estou falando de ir à igreja, dar os dízimos e não assistir novelas. Os irmãos de Éfeso faziam muito mais que isso e haviam perdido o seu primeiro amor por Jesus.

Isso me faz lembrar do episódio onde os pais de Jesus, quando ele tinha 12 anos, o deixaram para trás, em Jerusalém, por todo um dia no caminho de volta, sem darem-se conta disso (Lucas 2.41-52). E tiveram de voltar para Jerusalém, e ainda levaram três dias para encontrá-lo. Não é interessante como isso parece acontecer conosco também? Perdemos Jesus em nossa caminhada, em algum ponto onde nem nos lembramos mais onde foi. E precisamos procurar a Jesus novamente, para termos um novo encontro e uma nova experiência com Ele. Você já se sentiu assim alguma vez?

É o que havia acontecido com os irmãos da igreja em Éfeso, e é o que acontece conosco muitas vezes também. "A mim, nem sempre me tendes" - disse Jesus. É essa palavra que ecoou em meu coração quando li o texto inicial desse estudo. Precisamos cultivar e saber aproveitar a presença de Jesus, como a mulher de Betânia, com o vaso de alabastro, fez (Mateus 26.6-13).

E quando perdemos a direção e a presença real de Jesus - o primeiro amor - como fazemos para reencontrá-lo? É uma boa pergunta, não é?

Reencontrando a Presença Real de Jesus


No texto de Apocalipse 2.5 temos a receita do próprio Jesus sobre como voltar a encontrá-lo e viver novamente no "primeiro amor":

"Lembra-te, pois, de onde caíste, arrepende-te e volta à prática das primeiras obras; e, se não, venho a ti e removerei do seu lugar o teu candelabro, caso não te arrependas". Apocalipse 2.5.


Ele nos aconselha a fazer três coisas, ou três passos que devemos percorrer:


1. Lembrar de onde caímos: onde foi que começamos a perder a direção? Em que ponto? Quando foi e por que aconteceu? Foram certas decisões que tomamos, certas pessoas com quem nos relacionamos? Por causa de algum trabalho ou estudo que iniciamos? Sejam quais forem os fatores que nos fizeram perder essa intimidade e presença sensível de Jesus, precisamos identificá-los. Pois assim podemos fazer as correções necessárias. E porque também, tenho aprendido, Deus sempre retoma sua obra em nós no ponto em que parou, mesmo que tenha sido há anos atrás. Os pais de Jesus precisaram voltar e encontrar Jesus onde o haviam esquecido - e levou 3 dias para eles chegarem lá! O Senhor não tem atalhos. Ele sempre retoma sua obra em nós do ponto em que paramos de corresponder a Ele.


2. Arrepender-se: uma vez que você identificou os fatores que o afastaram da intimidade e do amor perceptível de Jesus, você deve reconhecer que foram errados, por mais que se tratem de coisas caras e importantes para você. É um processo crítico e algo que deve acontecer em seu íntimo. O desejo de voltar a experimentar o amor de Jesus deve ser cultivado até ao ponto em que leve você a deixar tudo que o impede de experimentá-lo e passar a segui-lo (Lucas 5.11) - isso é arrependimento. Esse é o objetivo final de tudo aquilo que Jesus faz em nossa vida: nos levar a deixar tudo para segui-lo.


3. Voltar à prática das primeira obras: essa é uma coisa bem prática e essencial. O que você costumava fazer e deixava o seu coração tão apaixonado por Jesus? Participava de vigílias? Comece a participar de novo. Evangelizava nos bairros, hospitais ou presídios? Recomece. Visitava pessoas para falar do amor de Jesus? Volte a fazê-lo. Lia muito a Bíblia e derramava seu coração diante do Senhor? Comece a fazer isso de novo, agora mesmo. Era uma pessoa mais simples e humilde, sem se importar com as aparências? Pode estar aí algo que volte a trazer-lhe a alegria da salvação e um novo perfume de Cristo por onde quer que você passe. Volte às primeiras obras. Volte aos fundamentos. Restaure os princípios corretos negligenciados ao longo do tempo.


Onde está Jesus? Onde você o deixou da última vez na qual teve um encontro marcante e verdadeiro com Ele. Volte lá, a essa posição e atitude, que o Senhor o está esperando de braços abertos.

Roberto Coutinho